Esta
talvez seja uma das resenhas mais difíceis que eu tenha enfrentado. A autora de
O Alfaiate Polonês – Babilonia Cultura Editorial – 2016 – 180 págs., Débora
Finkielsztejn, é uma amiga de longa data. Para ser mais específico, da turma de
1989 da Faculdade de Economia, na Universidade Federal Fluminense.
Débora
trilhou caminhos diversos antes de aportar na epopeia de se tornar escritora.
Talvez aquele que mais tenha lhe tocado sobre o mundo dos livros tenha sido sua
jornada enquanto livreira – proprietária da Livraria Da Conde, como foi,
durante 10 anos, não fosse ela de uma família sempre presente no meio artístico.
Estar imersa a grandes autores deve ter aguçado sua curiosidade quanto a
transpor a fronteira e ir para o outro lado, a ver o que impulsiona os
escritores a colocar no papel ideias, estórias e histórias, e principalmente,
sentimentos.
Débora Finkielsztejn (à esquerda) ao lado da amiga Viviane Aben-Athar, durante lançamento do livro, na Livraria da Travessa, em Ipanema, no último dia 24 de Outubro. |
Sim,
porque a estória de O Alfaiate Polonês, essa pequena joia de estreia, gira em
torno de sentimentos. A família Luittermann, judeus separados pela guerra, tem
sua trajetória narrada, atravessando distintas gerações, até que surge a
possibilidade da reunião. Como personagem central, Avraham, filho mais velho do
núcleo central da narrativa. Ele tem a nobre companhia, como coadjuvante, de
seu irmão, Shlomo, que nos guia no primeiro terço da obra.
Como
algo a criar um laço afetivo com o leitor brasileiro, e o carioca em
particular, tal qual Débora, a ambientação de parte da estória se passa no Rio
de Janeiro, nos trazendo, de leve, as referências geográficas, mescladas, mais
uma vez, aos sentimentos que evocam. Assim como somos assaltados por outros
pensamentos e dizeres que nos vêm à boca em meio a dilemas ocorridos na
Polônia, França, Israel, Canadá... Mesmo que nunca tenhamos tido a oportunidade
de estar em tais países – ainda mais em difíceis épocas passadas – os problemas
que os seres humanos enfrentam, superados ou não, se fazem presentes no esforço
individual de cada personagem, criando uma conexão com a alma de quem estar por
ler aquela trajetória. Como reagiríamos em tal situação? Será que a decisão por
ele tomada foi a melhor de todas? Não haveria outras possibilidades para o
eterno reconstruir da vida?
Durante
o primeiro dos muitos eventos de lançamento do livro, fomos brindados com um
debate na Livraria Da Vinci. Naquela ocasião, uma das perguntas foi sobre se o
livro teria um público circunscrito à comunidade judaica, a partir do momento
que tem como eixo central uma família seguidora da estrela de Davi. No mesmo
instante pensei – e por obra de D’us tal aspecto foi abordado por um dos
debatedores – que uma boa estória é uma boa estória e ponto. Ela pode ser de
uma família italiana, africana, indiana, budista, hippie, ou qualquer outra
religião professada. Ela irá singrar os mares da boa literatura, atraindo os
leitores, independentemente de sua caracterização central. E assim é o que se
passa com os Luittermann. Somos chamados a refletir sobre o que nos une, sobre
laços familiares e de amizades construídas em meio às dificuldades. Tal tema é
de um universalismo que independe de quaisquer outros aspectos.
Mas,
para mim em particular, sair do macro e ir para o micro, a buscar aspectos que
pudessem ser lidos somente por quem conhece a autora de perto, também se
transformou numa deliciosa aventura. Esta expectativa, por assim dizer, de uma “investigação
particular”, não é algo que fácil de partilhar. É como perguntar para o
artilheiro qual é o sentimento quando se marca um gol. Somente ele saberá. E
somente nós que convivemos com Débora poderemos empreender esta jornada específica.
Da
minha parte ficou a impressão que uma personagem em particular representava a
Débora em suas colocações, em sua visão de mundo. Trata-se de Rachel. E o mais
interessante é que Rachel, com “ch”, também é uma de nossas amigas em comum,
aquela com a qual Débora dividia sua angústia com aulas imersas entre Keynes,
Marx, David Ricardo entre outros. Posso estar enganado? Posso, mas quem comanda
o que a imaginação sugestiona?
Desta
forma, mesmo que inconscientemente, todo um grupo foi homenageado. A
Rachel/Débora representou, para esta pequena família formada na Rua Tiradentes,
Ingá, em Niterói, a cereja do bolo de um presente que nos foi franqueado. Aos
demais leitores fica a certeza de uma prazerosa leitura, daquelas para usufruir
num final de tarde, no Arpoador, ou se tiver aquela chuvinha, debaixo dos
lençóis. Shalom!
Muito boem meu irmão. Como sempre consegue colocar questões que passam de leve em nosso consciente. Perfeita análise. E não é por ser nossa amiga, o livro é muito bom mesmo!!!
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