Unanimidades
são difíceis de encontrar. Certamente alguém não deve gostar dele. Mas eu ainda
não encontrei. Estou falando do professor e filósofo Mario Sergio Cortella.
“Conhecido pelas suas inúmeras palestras, participações em debates e em
programas no rádio e na TV, nesta obra faz este provocativo convite: pensar
grandes temas a partir de pequenas reflexões” – trecho da contracapa.
A
obra a qual será objeto de nossa resenha é justamente “Pensar bem nos faz
bem!”, volume 4 de uma coleção originada a partir dos comentários do autor na
coluna Academia CBN, apresentada em rede nacional entre os anos de 2013 e 2014.
A editora responsável foi a Vozes, de Petrópolis, Rio de Janeiro, tendo
publicado tais textos no ano de 2015, sendo este volume especificamente
composto de 136 páginas.
A
linguagem apresentada por Cortella, como de praxe, apesar da erudição de
informações com as quais ele permeia seu discurso, é de fácil entendimento.
Cada um dos textos são curtas digressões sobre temas vários, voltados
principalmente para as atitudes humanas perante dilemas existenciais ou simples
problemas do cotidiano. Seria como pequenas homilias sobre o bem viver – e de
que modo este vem a ser constituído.
O
que me atraiu no volume 4 – adquirido na pequena loja dos beneditinos junto à
igreja de São Bento, em Recife, Pernambuco – foi justamente o sub-título:
vivência familiar, vivência profissional, vivência intelectual e vivência
moral. Os quatro aspectos são de grande interesse para mim, e fiquei interessado
em conhecer a abordagem específica do autor para cada um dos temas.
Nesse
ínterim, me decepcionou que o livro não fosse dividido por capítulos ou seções
temáticas, mas que seguisse livremente o curso das ponderações, sem uma ordem
pré-concebida. Acredito que isso dificulta a identificação de temas de
interesse, numa obra que poderia servir de base para inúmeros clubes de
debates. A intenção, segundo os editores, foi de “preservar a característica
que a coluna tem no cotidiano”, ou seja, o ouvinte não conhecia de antemão o
tema que seria abordado.
Cortella
surgiu para mim, salvo engano, a partir de uma entrevista dada num talk-show, o qual infelizmente não me
recordo quando e em que canal de televisão. Lembro-me apenas que ele me
impactou positivamente por sua interpretação lúcida sobre as diatribes
políticas por trás da indicação/eleição de um papa, fruto talvez de sua
formação enquanto cristão nas hostes religiosas. Nascido
em Londrina/PR em 05 de Março de 1954, filósofo e escritor, com Mestrado e
Doutorado em Educação, professor-titular da PUC-SP (na qual atuou por 35 anos,
1977/2012), com docência e pesquisa na Pós-Graduação em Educação: Currículo
(1997/2012) e no Departamento de Teologia e Ciências da Religião (1977/2007); é
professor-convidado da Fundação Dom Cabral (desde 1997) e ensinou no GVpec da
FGV-SP (1998/2010). Foi Secretário Municipal de Educação de São Paulo
(1991-1992) [Fonte: www.ferrazcortella.com.br].
A partir daí passei a observar com atenção suas aparições. Em
tempos de mídias sociais duas delas ganharam destaque para mim. Um vídeo no
YouTube de uma palestra dada a funcionários do Banco do Brasil, salvo engano,
no qual ele aponta a pequenez da pergunta “Você sabe com quem está falando?”. A
outra quando ele disserta sobre atitudes éticas, definindo-as como aquelas nas
quais são respeitadas três condições: para empreender um ato deve-se observar
se o autor deve fazê-lo; quer fazê-lo; e pode fazê-lo. Se uma dessas três
condições não for respeitada, você não está diante de uma atitude ética.
Enfim, um livro curto, de textos curtos, para ser lido
vagarosamente enquanto se espera o tempo passar. Assim sendo, é a deliciosa
definição de um bom... passatempo. Que nos faz pensar. E pensar, nos faz bem!
Pequenas
pílulas
Esforço Criativo – “Não é sentar e
aguardar, não é repousar e, então, seremos possuídos por um momento de grande
movimento cerebral. Não é só isso, é colocar-se no esforço” (pág. 54).
Rabugice – “Diz Deus para
Mefistófeles: ‘Nada mais que dizer-me tens, só por queixar-te sempre vens, nada
na Terra achas direito enfim’. Até a divindade chama a atenção de Mefistófeles
por essa conduta rabugenta. (...) Nem Deus resistiu, na obra de Goethe” (pág.
60).
Discordância – “Sabemos: algo
inerente à vitalidade republicana é a capacidade de acolher a discordância, a
oposição respeitosa, a discussão que fica fora do pensamento único” (pág. 62).
Autoimplacabilidade – “Ser rigoroso
demais consigo mesmo é considerar que aquilo que faz não é o jeito correto de
fazer, quando, eventualmente, até o é” (pág. 71).
Propósito – “(...) pessoas
que agem com uma convicção, com um propósito, com uma finalidade de causa que
ajuda a elevar; elas têm um poder mais forte do que apenas aquelas que têm a
ideia do autobenefício, da autoapropriação” (pág. 74).
Personalidade – “Há uma frase
antiga, que circula por aí, que diz: ‘Não me envergonho dos homens que já fui’.
Ela aponta a possibilidade de nos olharmos na nossa condição de termos sido de
outros modos” (pág. 75).
Ocasião Propícia – “(...) o
momento em que se junta a ação com a ocasião” (pág. 78).
Um novo tempo – “Quando a
decisão pelo carpe diem nos agrada,
não deveria ser um chamado ao desvario, mas sim a ideia de não deixar de pegar
o que o dia oferece” (pág. 79).
Vaidade – “(...) ser
lembrado para uma atividade, ser elogiado por algo ou ser elevado na condição
criada acaba ganhando uma marca vaidosa, muito mais pelo fato de se supor
merecedor daquilo do que pelo conteúdo que aquilo carrega” (pág. 83).
Acomodação – “A resignação
mata a própria dignidade, porque tem, por princípio, a suposição de que nada
pode ser feito ou porque falta coragem para fazê-lo” (pág. 93).
Partilha – “(...) a
expressão ‘cada um é responsável por todos’ é indicadora de uma sanidade de
vida que impeça que sejamos prisioneiros de uma tolice imensa, que é o egoísmo’”
(pág. 97).
Expectativas
enganosas
– “(...) o número de coisas que nos assustam é muito maior do que aquilo que
concretamente poderá nos fazer mal. Ser capaz de distinguir, de vislumbrar a
diferença entre uma e outra, é algo que expressa inteligência” (pág. 111).