domingo, 29 de janeiro de 2017

Pensar Bem Nos Faz Bem

Unanimidades são difíceis de encontrar. Certamente alguém não deve gostar dele. Mas eu ainda não encontrei. Estou falando do professor e filósofo Mario Sergio Cortella. “Conhecido pelas suas inúmeras palestras, participações em debates e em programas no rádio e na TV, nesta obra faz este provocativo convite: pensar grandes temas a partir de pequenas reflexões” – trecho da contracapa.

A obra a qual será objeto de nossa resenha é justamente “Pensar bem nos faz bem!”, volume 4 de uma coleção originada a partir dos comentários do autor na coluna Academia CBN, apresentada em rede nacional entre os anos de 2013 e 2014. A editora responsável foi a Vozes, de Petrópolis, Rio de Janeiro, tendo publicado tais textos no ano de 2015, sendo este volume especificamente composto de 136 páginas.

A linguagem apresentada por Cortella, como de praxe, apesar da erudição de informações com as quais ele permeia seu discurso, é de fácil entendimento. Cada um dos textos são curtas digressões sobre temas vários, voltados principalmente para as atitudes humanas perante dilemas existenciais ou simples problemas do cotidiano. Seria como pequenas homilias sobre o bem viver – e de que modo este vem a ser constituído.

O que me atraiu no volume 4 – adquirido na pequena loja dos beneditinos junto à igreja de São Bento, em Recife, Pernambuco – foi justamente o sub-título: vivência familiar, vivência profissional, vivência intelectual e vivência moral. Os quatro aspectos são de grande interesse para mim, e fiquei interessado em conhecer a abordagem específica do autor para cada um dos temas.

Nesse ínterim, me decepcionou que o livro não fosse dividido por capítulos ou seções temáticas, mas que seguisse livremente o curso das ponderações, sem uma ordem pré-concebida. Acredito que isso dificulta a identificação de temas de interesse, numa obra que poderia servir de base para inúmeros clubes de debates. A intenção, segundo os editores, foi de “preservar a característica que a coluna tem no cotidiano”, ou seja, o ouvinte não conhecia de antemão o tema que seria abordado.

Cortella surgiu para mim, salvo engano, a partir de uma entrevista dada num talk-show, o qual infelizmente não me recordo quando e em que canal de televisão. Lembro-me apenas que ele me impactou positivamente por sua interpretação lúcida sobre as diatribes políticas por trás da indicação/eleição de um papa, fruto talvez de sua formação enquanto cristão nas hostes religiosas. Nascido em Londrina/PR em 05 de Março de 1954, filósofo e escritor, com Mestrado e Doutorado em Educação, professor-titular da PUC-SP (na qual atuou por 35 anos, 1977/2012), com docência e pesquisa na Pós-Graduação em Educação: Currículo (1997/2012) e no Departamento de Teologia e Ciências da Religião (1977/2007); é professor-convidado da Fundação Dom Cabral (desde 1997) e ensinou no GVpec da FGV-SP (1998/2010). Foi Secretário Municipal de Educação de São Paulo (1991-1992) [Fonte: www.ferrazcortella.com.br].

A partir daí passei a observar com atenção suas aparições. Em tempos de mídias sociais duas delas ganharam destaque para mim. Um vídeo no YouTube de uma palestra dada a funcionários do Banco do Brasil, salvo engano, no qual ele aponta a pequenez da pergunta “Você sabe com quem está falando?”. A outra quando ele disserta sobre atitudes éticas, definindo-as como aquelas nas quais são respeitadas três condições: para empreender um ato deve-se observar se o autor deve fazê-lo; quer fazê-lo; e pode fazê-lo. Se uma dessas três condições não for respeitada, você não está diante de uma atitude ética.

Enfim, um livro curto, de textos curtos, para ser lido vagarosamente enquanto se espera o tempo passar. Assim sendo, é a deliciosa definição de um bom... passatempo. Que nos faz pensar. E pensar, nos faz bem!

Pequenas pílulas

Esforço Criativo – “Não é sentar e aguardar, não é repousar e, então, seremos possuídos por um momento de grande movimento cerebral. Não é só isso, é colocar-se no esforço” (pág. 54).

Rabugice – “Diz Deus para Mefistófeles: ‘Nada mais que dizer-me tens, só por queixar-te sempre vens, nada na Terra achas direito enfim’. Até a divindade chama a atenção de Mefistófeles por essa conduta rabugenta. (...) Nem Deus resistiu, na obra de Goethe” (pág. 60).

Discordância – “Sabemos: algo inerente à vitalidade republicana é a capacidade de acolher a discordância, a oposição respeitosa, a discussão que fica fora do pensamento único” (pág. 62).

Autoimplacabilidade – “Ser rigoroso demais consigo mesmo é considerar que aquilo que faz não é o jeito correto de fazer, quando, eventualmente, até o é” (pág. 71).

Propósito – “(...) pessoas que agem com uma convicção, com um propósito, com uma finalidade de causa que ajuda a elevar; elas têm um poder mais forte do que apenas aquelas que têm a ideia do autobenefício, da autoapropriação” (pág. 74).

Personalidade – “Há uma frase antiga, que circula por aí, que diz: ‘Não me envergonho dos homens que já fui’. Ela aponta a possibilidade de nos olharmos na nossa condição de termos sido de outros modos” (pág. 75).

Ocasião Propícia – “(...) o momento em que se junta a ação com a ocasião” (pág. 78).

Um novo tempo – “Quando a decisão pelo carpe diem nos agrada, não deveria ser um chamado ao desvario, mas sim a ideia de não deixar de pegar o que o dia oferece” (pág. 79).

Vaidade – “(...) ser lembrado para uma atividade, ser elogiado por algo ou ser elevado na condição criada acaba ganhando uma marca vaidosa, muito mais pelo fato de se supor merecedor daquilo do que pelo conteúdo que aquilo carrega” (pág. 83).

Acomodação – “A resignação mata a própria dignidade, porque tem, por princípio, a suposição de que nada pode ser feito ou porque falta coragem para fazê-lo” (pág. 93).

Partilha – “(...) a expressão ‘cada um é responsável por todos’ é indicadora de uma sanidade de vida que impeça que sejamos prisioneiros de uma tolice imensa, que é o egoísmo’” (pág. 97).


Expectativas enganosas – “(...) o número de coisas que nos assustam é muito maior do que aquilo que concretamente poderá nos fazer mal. Ser capaz de distinguir, de vislumbrar a diferença entre uma e outra, é algo que expressa inteligência” (pág. 111).

Um comentário:

  1. Gosto muito do Cortella! Já assisti algumas de suas palestras e entrevistas na TV e internet e me parece uma pessoa bastante lúcida. O livro deve ser tão interessante quanto. Obrigada pela dica!

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