“(...) comecei
a conversa dizendo a verdade: que eu sempre havia considerado a religião como
uma forma de ilusão de massas e que, como cientista, achava difícil aceitar que
bilhões de pessoas inteligentes contassem com suas respectivas crenças religiosas
para ser consoladas e orientadas”.
Pág. 57
A última
obra de Dan Brown, conhecido autor de O
Código Da Vinci entre outros, chama-se Origem.
Editado pela Arqueiro, em 2017, o thriller contendo 432 páginas discorre sobre
a estória de um brilhante cientista que desafia o conceito das religiões a
partir da busca pela resposta a duas perguntas: De onde viemos? E para onde
vamos?
Fonte: https://pausadramatica.com.br/ |
Edmund Kirsh,
o cientista acima indicado, como não podia deixar de ser, é um conhecido e
célebre colega do simbologista Robert Langdon, personagem central desta série
de estórias de enigmas entrelaçados desenvolvida por Brown no decorrer dos
anos. A narrativa se passa na Espanha, onde Kirsh tem como sede para suas
pesquisas. Ele atrai a futura rainha daquele país, Ambra Vidal, então diretora
do Museu Guggenheim em Bilbao, para receber uma de suas apresentações na qual
ele se propõe expor suas teorias para responder tais perguntas e desmoralizar
de uma vez o conceito religioso quanto à existência de um Deus criador.
Leitores
como eu, católicos, ficam acompanhando a narrativa se perguntando como um autor
de ficção como Brown irá expor uma teoria até então inexistente que poderia abalar
a religião tal como a enxergamos hoje em dia. Fato é que mesmo após o
lançamento, nada do que foi dito no livro gerou algum tipo de desdobramento, o
que, como leitores, nos leva a crer que qualquer que fosse a teoria estaria no
campo das hipóteses que não responderia tais perguntas de maneira a solapar a
esperança e a fé de bilhões.
Particularmente
tenho uma visão muito simples sobre este ponto: a teoria mais aceita até hoje pelo
meio científico em relação à origem do universo – e da vida nele, este sim o
ponto central da polêmica debatida no livro – é o Big Bang. Eu sempre digo que
ela não é, de modo algum, contrária ao que a religião católica prega, pois os
estudiosos mais modernos da Bíblia já esclareceram que, principalmente o Antigo
Testamento, é uma peça ilustrativa no que diz respeito ao Gênesis, de modo a
explicar de maneira simples para os povos da época conceitos de convivência em
comunidade, indicando os preceitos determinados pela religião. Não é uma
verdade literal dos fatos.
Feito
este esclarecimento, o embate entre os chamados criacionistas e cientistas cai
por terra. A minha pergunta central permanece, e sustenta toda a minha crença e
fé em Deus: o que veio antes do Big Bang? Não existe resposta para esta
pergunta, nem mesmo para um autor tão imaginativo como Brown.
Do livro
em si, trata-se mais um daqueles que nos prende do início ao fim, dada a
aceleração de acontecimentos que passam diante de nossos olhos. Brown soube com
maestria aliar a nova linguagem de mídia, incorporando no corpo do texto exemplos
de exposição na mídia eletrônica, mais especificamente na internet, de uma página
imaginária com seus posts indicando o impacto da tecnologia e da disseminação
da informação – mesmo que enganosa – via internet. A Conspiracy.net torna-se assim um personagem à parte da trama, meio
que como um animador de auditório lembrando ao leitor o ritmo alucinante em que
vivemos atualmente, bombardeados de informações nem sempre verdadeiras, para
com as quais temos que ter o discernimento de separar o joio do trigo.
E é
justamente esse esforço que o leitor é convidado. O livro vai num crescente até
o momento da exposição da teoria propalada em seu início. O leitor fica na expectativa
de conhecê-la, para refutá-la ou não com suas próprias crenças pessoais, religiosas
ou científicas. Por trás disso tudo, pelo menos duas tramas paralelas que
somente são desvendadas nos capítulos finais, e para as quais nem por um momento
o leitor tem a mínima noção, demonstram como Brown é um tecelão de temas,
apontando para talvez para as principais mensagens que queira passar para seus
fãs: a importância da tolerância em nossa sociedade; e o perigo que estamos
correndo em não saber lidar com o desenvolvimento e a inserção desenfreada da
tecnologia em nossas vidas.
Por
último, já nos agradecimentos – seção na qual descobrimos que pelo menos dois
personagens foram denominados a partir de pessoas existentes na vida real –
temos um insight de que talvez Brown
tenha um desejo secreto com sua série de livros nos quais Langdon é protagonista.
Ele diz: “Em primeiro lugar, ao meu editor e amigo Jason Kaufman, por seu
conhecimento profissional (...); mas, acima de tudo, por (...) sua compreensão
do que estou tentando realizar com essas histórias” (pág. 428). O que será? Os
leitores vorazes de Brown teriam ideia?
Em sua página
oficial ele é assim descrito:
The son of a
mathematics teacher and a church organist, Brown was raised on a prep school
campus where he developed a fascination with the paradoxical interplay between
science and religion. These themes
eventually formed the backdrop for his books. He is a graduate of Amherst College and Phillips Exeter
Academy[1]
(…).
Podemos
então imaginar que o principal objetivo de Brown é conciliar a visão religiosa
com a científica, propiciando o dito equilíbrio entre duas abordagens distintas
e diminuindo a tensão existentes em nossa sociedade envolta em dogmas políticos
e sociais?
No livro, um símbolo para ateus. Para os nerds, Avengers? |
Isso
é possível, dado que o personagem principal de Origem busca a mesma coisa, solapando a religião porém, em prol de
uma adoração à ciência como o caminho para agregar as pessoas em torno de um
bem comum – algo que é rejeitado, em certa medida, por Langdon, o qual por sua
vez acreditamos ser o alter ego do autor. Em assim sendo isso possibilita, portanto,
deduzir, que ao contrário de Kirsh, Brown defenda a coexistência entre religião
e ciência como sua verdadeira missão. E nada melhor que um simbologista para
lidar com tais temas, dado que ambos os espectros – tais talvez como nossa vida
enquanto seres humanos – a religião e a ciência, são repletos de símbolos, que
por sua vez acabam por justificar muitas de nossas atitudes em sociedade.
Eu li e gostei, a despeito de parte do enredo ser previsível pois conhecemos o protagonista e seu criador desde muitos livros e de não ter gostado do desfecho final.
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