Transporte
urbano. Este talvez seja um dos grandes dilemas da sociedade moderna. A
qualidade de vida é diretamente medida, dentre outros indicadores, pela
possibilidade de deslocamento rápido de um ponto a outro da cidade, qualquer
que seja sua origem e seu destino. Em tempos de estrutura precária em termos de
opções para o transporte coletivo – todos sempre cheios, ou todos com atrasos,
ou em estado precário, ou pior, tudo isso junto – a depender do custo associado,
os táxis acabam ganhando uma preferência particular para aqueles que podem
suportá-lo em termos financeiros.
Buenos
Aires é uma dessas cidades que estão neste grupo. Repleta de taxistas, para
todos os gostos, e com a comparativa valorização cambial em favor do real,
propicia aos brasileiros a alternativa de uso pelos “amarillos y negros” para o
deslocamento fácil numa capital que pouco a pouco vai se tornando tremendamente
conhecida para nós, tal o afluxo de turistas que todo ano para lá se dirige. Eu
mesmo, por questões profissionais, já estive por lá muitas vezes nos últimos
anos, e sempre me utilizei dos táxis da cidade para deslocar, sem utilizar
nenhuma outra opção.
Um
livro descortina o universo dos taxistas portenhos: “Taxi Libre: agenda de un
taxista” – Mario Aramburu – Editorial de Arte – 2012 – 96 págs. Aramburu,
Presidente do Instituto Nacional da Propriedade Industrial da Argentina, figura
singular com a qual tenho o prazer de conviver profissionalmente, tem como
principal característica pessoal um humor sarcástico – para alguns talvez ácido
demais – que, uma vez sendo assimilado de maneira afável, torna-se
um grande companheiro para boas histórias.
Com
esse olhar, nada mais natural para ele que se identificar com o humor característico
e as histórias relatadas pelos taxistas de Buenos Aires. Tais histórias, muito
provavelmente, encontram similitude com esta mesma classe em outros países.
Porém, bem o sabemos que cada povo guarda um certo traço peculiar, e nossos
vizinhos, com os quais travamos relacionamento há séculos, já marcam sua
presença pela picardia típica do Rio do Prata, identificando os pontos fracos
do “adversário” para poder marcá-lo em sua argumentação e convivência. Quando
isto é feito com o devido bom humor, sabendo-se compreender seu contexto,
estamos inseridos então num ambiente de confortável viver.
Por
experiência própria posso lhes dizer que a tão divulgada rivalidade entre
brasileiros e argentinos, que gera uma constante fonte de piadas de ambos os
lados, se atém na maior parte das vezes ao mundo esportivo. Acredito que ambos
os povos já notaram – e aqui não se encontra nenhuma avaliação em termos
governamentais, devo dizer, mas sim humanos – que somente juntos poderão
construir um futuro melhor para suas respectivas sociedades. Temos inclusive
uma província deles aqui no Brasil, chamada Búzios, muito bem freqüentada por
todos, sem nenhum tipo de problema.
Um típico táxi de Buenos Aires
Este
contexto acima apontado por mim foi reforçado justamente nas duas últimas
viagens feitas à Buenos Aires, à bordo dos táxis daquela capital. Tive pelo
menos três ótimas conversas com taxistas daquelas cidades – uma sobre futebol,
é claro, e a qualidade da seleção deles, outra sobre economia (e como os
brasileiros vêem a situação econômica de nossos vizinhos) e a evolução das
mulheres na sociedade. Este último, em especial, teve o seguinte dizer: “Se
hoje em dia um homem anuncia para sua mulher que irá sair de casa ela lhe diz –
‘Vá, vá logo, tome o cartão do meu advogado e não me procure mais’. Não existe
mais aquela mulher que fica se lamentando...”.
São
histórias como essas que encontramos em Taxi Libre. Aqui, abaixo, um pequeno
trecho para aguçar sua curiosidade, en bueno español:
Ese diván circunstancial y ambulante en que a menudo
se convierte un taxi, tiene un ida y vuelta. [...] Ese día Ramón andaba con
ganas de hablar y aprovechó al primer pasajero con cara de saber escuchar para
hablar contar sus problemas, sobre todo amorosos. [...] El pasajero asentía con
monosílabos. Con algún que outro ‘hum’ que era como una invitación a seguir
hablando y Ramón siguió. [...] Pero ya estaban llegando a Salguero y Güemes, el
corazón de Villa Freud como se la llama en la Ciudad Autónoma de Buenos Aires y
el pasajero, sin mediar palabra le alcanzó junto con el precio del viaje una
tarjeta: “Germán Goldberg, psicoanalista”. Debajo una dirección y un teléfono.
Y le dijo: - Te espero el lunes, son cien pesos la sesión, pero por ser vos te
voy a cobrar ochenta. En esse mismo momento Ramón juró no confesarse jamás con
pasajeros de aspecto comprensivo.
(Confesiones al volante – págs. 76-77)
Achei ótimo... ( Susana S. from Facebook)
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