Moleque,
quando eu ouvia a música “Lêlê, lêlê, lêlê, lêlê, lêlê, lêlê, lêlê / Lêlê, lêlê,
lêlê, lêlê, lêlê, lêlê, lêlê / Vida de nêgo é difícil, é difícil como quê /
vida de nêgo é difícil, é difícil como quê” na voz de Dorival Caymmi, sabia que
a novela Escrava Isaura (1), de 1976, entraria no ar. Nela, a personagem-título
interpretada por Lucélia Santos passava o pão que o diabo amassou até ter o seu
maior desejo conquistado: liberdade!
Dizem
que as telenovelas têm algumas fórmulas, métricas mesmo, para garantir o
sucesso. Nada tão diferente, provavelmente, dos folhetins que eram publicados
nos jornais durante o século XIX e boa parte da primeira metade do século XX.
Ou ainda do que se cravou como sucesso absoluto na história da literatura
brasileira via José de Alencar, com os romances “O Guarani” (1857), “Iracema”
(1865) ou “Lucíola” (1862), por exemplo (2).
Pois
bem. Se tem um autor que em suas obras mais recentes nos leva a rememorar tais
caminhos, pela lógica da construção da narrativa e, obviamente, com um
linguajar mais moderno, este seria Ken Follet. Neste mesmo blog tivemos a oportunidade de analisar seu último tour de force, a trilogia “Queda de
Gigantes”, que além do primeiro livro homônimo teve ainda como segundo e
terceiro volumes, respectivamente, “Inverno do Mundo” e a “Eternidade por Um
Fio”. Nestes ele segue a trajetória de cinco famílias em diferentes países, que
têm suas vidas cruzadas em função de estarem no centro das ações das grandes
potências globais, geradoras de duas Guerras Mundiais e um ambiente de Guerra
Fria.
Acredito
que, fruto do esforço de pesquisa para a escrita das obras acima citadas,
Follet ainda teria ficado com o que poderíamos chamar de “rescaldo”. Enquanto
em “Queda de Gigantes”, a origem de uma das famílias que teve sua trajetória
seguida eram as minas no País de Gales, em “Um Lugar Chamado Liberdade” – Ed.
Arqueiro (a mesma da trilogia com a qual comparamos) – São Paulo – 2014 – 400 páginas
– ele remonta aos mineiros de carvão localizados na Escócia no século XVIII.
Vocês
poderiam alegar que aí existe um ligeiro desvio temporal, dado que em “Queda de
Gigantes” o autor em questão traçou sua rota a partir do final do século XIX.
Porém, todos os elementos que constavam numa obra se encontram na outra, sendo
feitos os devidos ajustes pela diferença no tempo – o amor não correspondido
(3); a luta pela sobrevivência em condições desumanas; senhores de escravos,
credores de gente de bem, mas ignorantes de seus direitos, etc. A própria
sentença, introdutória ao título, diz muita coisa: “Separados pela Diferença
Social, unidos pela Busca por (...)”.
Em
“Um Lugar Chamado Liberdade”, Mack MacAsh, logo no início, mineiro subordinado
à família Jamisson, descobre que pela legislação britânica teria direito à
liberdade desde que não completasse, após a maioridade, 1 ano e 1 dia de
trabalho nas minas. Tal ato jurídico era de desconhecimento total das famílias
lá instaladas, que ofereciam seus rebentos para os Jamisson automaticamente,
desde o batizado. Estamos em tempos de que os EUA ainda eram colônia da
Inglaterra, e os debates em torno da liberdade do país americano começavam a
ganhar força pelos lados de cá do Atlântico. Ou seja, ideias libertárias
vagavam pelo mundo, e estas moveram MacAsh em busca de seu intento.
Ken Follet |
O
livro em si prende, como todo bom folhetim, mas fica aquela sensação de que já
vimos isso antes, de que já sabemos o final dessa estória – aquele pensamento que
nos rondava (ronda!?) quando começamos a acompanhar uma novela: sabemos que o
mocinho fica com a bela moça no final, mas queremos acompanhar assim mesmo seu
duro trajeto até que consiga seu objetivo (4). Mas ninguém, nenhum leitor pode
dizer que foi pego desavisado. Follet entrega o que promete. Uma boa estória,
ambientada num passado em que as emoções não eram expostas em mídias sociais,
mas no relacionamento direto entre diferentes classes sociais em busca de uma
resposta própria do que deveria ser o mundo, ou como seria um mundo ainda melhor.
Como curiosidade uma versão em Inglês do livro contendo na capa a co-protagonista feminina. |
(3)
“Durante
uma visita dos Jamissons à propriedade, Mack acaba encontrando uma aliada
incomum: Lizzie Hallim, uma jovem bela e bem-nascida, mas presa em seu inferno
pessoal, numa sociedade em que as mulheres devem ser submissas e não têm
vontade própria” – contra-capa.
(4)
Contrariamente
do que está exposto na contra-capa do livro – “Ken Follet é um mestre absoluto
em criar tramas complexas e emocionantes” – eu não diria que são complexas. Mas
a emoção está sim, lá, presente.
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