sexta-feira, 8 de abril de 2016

MILLENIUM 2, 3 E... 4!?

No meu último aniversário ganhei como presente um vale para compras numa livraria. Perfeito. E lá fui eu... Levei 4 livros de uma tacada só. Nesta leva se encontravam as 3 últimas aventuras dos personagens Mikael Blomkvist e Lisbeth Salander, da até então trilogia Millenium, do sueco Stieg Larsson – Os Homens que Não Amavam as Mulheres; A Menina que Brincava com Fogo; e A Rainha do Castelo de Ar. Só que eu não adquiri o primeiro deles. Peraí, mas existe uma confusão por aqui. Explicando...

No meu pacote constava, além dos dois últimos, o quarto livro da até então trilogia (!?). Entenderam? Pois é, foi lançada recentemente uma nova aventura da dupla de personagens escandinavos. Porém esta mais recente estória foi escrita por um autor diferente – claro, pois Larsson faleceu de ataque cardíaco logo após a entrega dos manuscritos dos três livros acima citados à editora.
Stieg Larsson
Dada a impossibilidade, foi alçado à empreitada o escritor e jornalista policial David Lagercrantz, que gerou a obra intitulada
A Garota na Teia de Aranha. Sueco, teve como principal obra, entre romances publicados, a biografia de Zlatan Ibrahimovic, polêmico jogador de futebol sueco, finalista de prêmios literários naquele país nórdico.
David Lagercrantz, autor do livro 4 da série Millenium
A Garota na Teia de Aranha
 E por que eu não comprei o primeiro livro da agora quadrilogia? Pelo simples fato de já ter assistido o filme gerado a partir da obra original. E para horror dos puristas, não, não assisti a versão sueca – a primeira a ser lançada e muito elogiada, assim como suas sequências. E sim a produção hollywoodiana que conta com os atores Daniel Craig (a atual James Bond) e Rooney Mara nos papéis principais. O filme me agradou muitíssimo, o que atiçou a minha curiosidade quanto à sequência da estória.


Desta forma, vou dividir este meu post em 3 partes, para que vocês possam ter uma melhor visão do todo em relação à análise crítica que pretendo empreender:

Primeira Parte – a preocupação pela perda de aspectos centrais da obra

Quando comecei a leitura do livro 2 – A Menina que Brincava com Fogo – estava na minha mente, o tempo todo, se eu não havia perdido algum aspecto relevante por não ter lido o primeiro volume da obra de Larsson – Os Homens que Não Amavam Mulheres. Algo que não tinha ficado claro para mim era o desfecho do relacionamento entre Blomkvist e Salander. O filme deixou algo subentendido, que talvez na versão literária tenha ficado mais clara. E esta explicação na verdade eu só vim a obter no final do livro 3 – A Rainha do Castelo de Ar.

A conclusão a que eu cheguei foi a confirmação de algo que sempre defendi, que é a leitura dos livros que dão origem às versões cinematográficas antes destas serem vistas. Muitas referências ficam mais claras, e algumas vezes os diretores se perdem, achando que estariam explicando o óbvio. Por outro lado, algumas as versões para a telona têm este objetivo mesmo, de deixar uma dúvida no ar para aguçar o interesse dos espectadores por sua continuidade.

Pelo que pude perceber, lendo o livro 2, os principais elementos da estória estavam presentes na adaptação cinematográfica. Um ou outro aspecto poderia ser mais detalhado no filme, mas provavelmente ele ficaria ou longo demais ou voltado para um cenário que talvez não fosse o elemento central buscado. Existe um entendimento pelo leitor que, como no meu caso, não tivesse lido o original. Mas fica aquele desconforto por não ter navegado antes pelas páginas, como se faltasse algo. De qualquer modo, não é um pecado mortal ou uma tarefa impossível de ser empreendida – ver o filme e começar a ler o restante da obra pelo volume 2, digo.

Segunda parte – Livros 2 e 3

Explicada a minha sensação de (meio) alívio em relação ao temor pela perda de conteúdo, pude apreciar ao ler A Menina que Brincava com Fogo e A Rainha do Castelo de Ar uma das melhores obras a que tive acesso nos últimos anos – e olha que eu leio muito, e sobre diversos temas. Ok, são voltadas para quem gosta de thrillers de suspense investigativo, para quem aprecia a ótica jornalística pela apuração dos fatos, para quem se espanta com a capacidade que um número superrestrito de pessoas possui hoje em dia para rastrear vidas alheias pela internet, para os que adoram observar com lupa como os relacionamentos humanos são frágeis se não forem baseados em confiança mútua, para se indignar com os abusos do poder entre as pessoas, etc. Ou seja, uma dinâmica forte e ágil de escrita, que te prende do início ao fim.

A meu ver fica nítido – até pela história real de entrega dos manuscritos – que os livros 2 e 3 foram escritos de uma tacada só, como se fossem uma única obra, tendo uma separação em relação ao 1, a qual a própria narrativa deixa explícita. A estória de A Menina que Brincava com Fogo se passa cerca de pouco mais de 1 ano depois dos desdobramentos de Os Homens que Não Amavam as Mulheres: “Um ano antes, ele [Blomkvist] vivera esse furo [caso Wennerström] com uma satisfação colossal” (pág. 19). Já A Rainha do Castelo de Ar inicia-se na sequência imediata da ação encerrada ao final do volume anterior. Ou seja, se Larsson quisesse ter publicado sua obra em dois volumes, assim o poderia ter feito. Porém, digamos que foi inteligente da parte da editora em dividi-la em 3. Até mesmo porque o segundo e terceiro livros já são colossais por si só – 607 e 685 páginas respectivamente – imaginem se fossem reunidos num único tomo!

De todo modo, devo aqui salientar que à parte a imensa quantidade de páginas, é praticamente impossível largá-las antes do fim. Eu li os dois volumes em 1 semana cada, levando durante o final de semana para onde ia – para desespero da minha esposa. Se vale uma crítica, diria que o final do volume 3 aparenta como se o autor tivesse se esquecido de um pequeno detalhe, e ao lembrá-lo (ou dar-se conta de que havia um ponto que ainda não estava bem resolvido) ele estende a obra por um epílogo (últimas 26 páginas) que pouco acrescenta à estória. Seriam as tais páginas “dispensáveis”. Mas sabe-se lá o que se passa na cabeça de um escritor quando está diante de sua obra-prima – ‘Ela tem que ser perfeita!’ / ‘Não posso deixar essas pontas soltas’ – devem ser pensamentos angustiantes.

Vencida esta etapa eu me encontrava na seguinte situação: iria partir para a leitura do volume 4 com a sensação de que ali iria encontrar um esforço da editora para chupar ao máximo o sumo de uma fruta que já se encontrava esgotada. E este medo me assombrava... Mas já que eu havia me proposto, por que não fazê-lo? Uma expectativa baixa pode trazer boas supresas.

Terceira parte – Livro 4

No meu último post tratei da obra Sr. Holmes, no qual o autor Mitch Cullins se aventura sobre um personagem clássico, mas retirando-o do seu ambiente usual e inserindo-o numa fase tardia da sua vida, totalmente diversa da que foi tratada pelo autor original, Sir. Connan Doyle. Já em A Garota na Teia de Aranha a proposta colocada pela editora, e aceita pelo autor - David Lagercrantz – era de dar continuidade à trajetória dos personagens centrais elaborados e desenvolvidos por Stieg Larsson, ou seja, um risco muito mais alto.


O sentimento em geral, ao ler o livro, é de um anticlímax. Contribui para isso a morte inesperada de Stieg Larsson ao entregar os originais dos 3 primeiros livros para publicação. O que resta ao leitor imaginar? Será que o autor já tinha fechado o ciclo de seus principais personagens? Ou será que ele imaginava uma continuação?

Tenho o palpite de que Larsson iria continuar escrevendo sobre as peripécias de Lisbeth Salander. Duas razões básicas me levam a essa conclusão. Ele deixou ganchos para uma continuidade do trabalho. Uma delas começou a ser tratada por Lagercrantz – a irmã da personagem principal, Camilla Salander, aparece como principal antagonista no 4º livro. Além disso, existe o apoio da família Larsson pela continuidade – Erland Larsson (pai) e Joakim Larsson (irmão) são citados nos agradecimentos ao final do livro. Claro que tal pode estar inserido num contexto financeiro de mais exploração do legado deixado. Mas acredito que o cuidado com as referências às estórias anteriores, e o zelo que os herdeiros devem ter tido em todo o processo transcende somente este aspecto.

Porém, a meu ver, houve uma escolha equivocada por parte de David Lagercrantz: o desaparecimento da personagem Rosa Figuerola, especialista da Säpo, que havia criado um forte laço com Mikael Blomkvist no livro 3. Havia um ótimo caminho por aí a ser explorado. Mas aparentemente Lagercrantz preferiu um reboot do jornalista, co-protagonista da série.


Em resumo, o livro 4 demora a envolver o leitor, e quando o faz existe uma aceleração na trama, que acaba ficando superficial em relação ao suspense dos 3 livros iniciais. Pode ser uma diferença de estilo, pode ser a preocupação em se priorizar a ação ao invés da trama, pois superar Larsson seria difícil nesse quesito (pode ser até que uma diferença de 200 páginas para menos no livro 4 tenha tido uma influência nesse aspecto), pode ser um processo de adaptação do novo autor a um universo alheio, podem ser diversas coisas, mas fato é que o leitor de Larsson esperava algo sublime, e acabou por receber um livro de ação simples, dois pontos abaixo pelo menos das obras originais. Enfim, tudo indica que a saga continuará. Vamos ver se a experiência e o aprendizado fazem com que ela volte ao nível esperado.

4 comentários:

  1. Esta trilogia é viciante! Devorei logo que saiu aqui no Brasil. Os filmes não conseguem abordar um décimo do texto e deveriam ter optado por uma série (sem fazer as adaptações de costume e que estragam as obras). Uma leitura que vale a pena.

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  2. Concordo com a Débora !
    Também comprei a trilogia assim que saiu aqui. Difícil largar os livros.

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  3. Está na minha fila para ler. Minha querida Daniele C. me presenteou!!!

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  4. Léo, concordo com você sobre a última parte do terceiro livro. Lembro que "abandonei" meu livro nessa parte e não retomei a leitura durante certo tempo. A explicação pode ser a seguinte: ele morreu antes de finalizar o livro. Na minha opinião, a mulher dele terminou. Foi ela quem mandou a trilogia para a publicação após a morte dele.
    Assisti os filmes também e gostei; mas também concordei com você: os livros são superiores aos filmes.

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