segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

APARECIDA


Iniciamos com este post uma jornada passando por três obras assinadas pelo jornalista Rodrigo Alvarez, da TV Globo[1]. Na verdade este arco encerrará uma trajetória de 5 livros analisados em sequência cuja temática estará vinculada diretamente com a Igreja Católica, se levarmos em consideração que o último texto avaliou duas obras oficiais editadas pela mesma. Porém, agora, estaremos a bordo da exposição de uma visão externa ao objeto, a partir do olhar investigativo – e a inspiração ficcional gerada como se perceberá no livro dedicado à Maria Madalena – de um experiente periodista.

“Rodrigo Alvarez (...) atualmente é correspondente da TV Globo em Berlim. Desde 1999, como repórter, vem cobrindo os principais acontecimentos do Brasil e do mundo – (...) com destaque especial para Jerusalém, onde passou mais de três anos entre guerras e lugares sagrados para diferentes religiões” [2]. A obra que abordaremos - “Aparecida”, 2ª edição – Editora Globo, São Paulo, 2017 – 248 pág. - na verdade é uma edição revista e ampliada em comemoração ao jubileu de 300 anos de Nossa Senhora de Aparecida, a santa padroeira do Brasil.

Fonte: g1.globo.com

Como todo bom jornalista, Alvarez se dedica de corpo e alma a uma investigação para trazer ao leitor menos afeito à história religiosa deste símbolo de devoção católica brasileira detalhes que para muitos passam despercebidos. O livro se inicia com uma contextualização oficial, dado ser assinada, em prefácio à 2ª edição, pelo então reitor do Santuário de Nacional de Nossa Senhora de Aparecida, o Pe. João Batista de Almeida. O tom dado pelo religioso permeia todo o texto, como cerne do trabalho do autor. “Registrar fatos históricos não é tarefa fácil, principalmente quando não se teve as lentes possantes da tecnologia atual no ato do seu acontecimento. Mais difícil ainda, quando seus personagens não gozavam de projeção social; quando os protagonistas não eram contados como cidadãos influentes” (pág. 9).

Logo na primeira seção[3], que servirá de catapulta para os seguintes -  no sentido de ser o aguçador da curiosidade de como a santa chegou ao ponto de importância capaz de ser objeto de um atentado – o jornalista narra todo o processo de reconstrução da imagem encontrada em 1717 após o atentado ocorrido no ano de 1978. Para surpresa dos leitores, a imagem atual não é totalmente fidedigna a encontrada no rio Paraíba do Sul, recebendo acertos em sua estrutura, principalmente pela fragilidade do material e da cabeça, especificamente, mas também por questões estéticas e de coerência com o visual de uma santa.

Um toque alegórico que poucos se dão conta, simplesmente porque não param para pensar é, por exemplo, de que o manto e a coroa vieram depois. Ou seja, a imagem presente no imaginário de cada brasileiro foi sendo construída com o passar dos anos, retocada, aprimorada, até chegar ao estágio atual, na qual já foi beijada por 3 papas – São João Paulo II, Bento XVI e Francisco – o que denota sua importância na geografia político-religiosa mundial de tempos de embate por se manter e aumentar o rebanho em relação à concorrência.

Fonte: amazon.com.br
Passado esse primeiro momento, de gancho para aguçar a curiosidade de todos, a obra se estrutura com mais 3 seções numa sequência cronológica para narrar a trajetória da santa desde seu reconhecimento até seu “credenciamento” enquanto Padroeira do Brasil. A segunda seção denomina-se “Identidade: Aparecida” – no qual se destaca a informação de que ela teria surgido primeiro como Nossa Senhora da Conceição: “Entre os inúmeros nomes que tinha à disposição, no momento em que aquela santinha de barro foi concebida no interior de São Paulo, muito antes de alguém pensar em chamá-la de Aparecida, o escultor desconhecido escolheu chamá-la de Nossa Senhora da Conceição” (pág. 83). Isto por conta de um decreto da Real Corte Portuguesa, que tinha esta última como padroeira do seu Império, e para o qual exigia que imagens fossem construídas e assim batizadas em todo o seu território. “Eram ordens do rei com carimbo do papa e entravam em vigor imediatamente para todos os habitantes dos domínios portugueses” (pág. 86).

Já a 3ª seção – Trevas e Redenção – aborda o mau gerenciamento do santuário criado em favor de políticos e agentes públicos indicados ora pela Coroa Portuguesa ora pelo próprio Império, tendo o Brasil já se tornado independente de Portugal. Grande destaque é dado àqueles que se organizaram suficientemente e com zelo para que Nossa Senhora de Aparecida tivesse um santuário à altura de sua importância, como o cônego Joaquim de Monte Carmelo (capítulo 20 – O cônego, os bispos e o imperador – e seguintes), e os padres alemães que vieram da cidade de Altöting[4] (capítulo 24 – Para redenção, contra desordem e corrupção, chamem os alemães! – e seguintes).

Na última seção – A Rainha, os Papas e os Presidentes – o olhar mais acurado se dá em torno da utilização política, a partir da influência de Nossa Senhora de Aparecida sobre os devotos brasileiros, ora para o apaziguamento de conflitos existentes, ora como meio de propaganda de um determinado regime. Porém, a meu ver, o livro termina enfatizando, como já dito anteriormente, o papel do Brasil na geopolítica católica mundial, dado o volume de devotos e o recado dado aos demais pela perseverança na fé.

Concluo confirmando minha percepção que, em geral, livros escritos por jornalistas têm uma leveza e uma dinâmica toda especial. Favorecendo demasiado o leitor seu acompanhamento, dada à riqueza de informações e o ritmo didático apresentado, Rodrigo Alvarez se apresenta como alguém que merece novas leituras, como assim o fiz. Será que ele manterá essa primeira boa impressão? Veremos nos próximos posts.


[1] Para mais detalhes ver https://redeglobo.globo.com/ .
[2] Descrição presente na orelha do livro aqui avaliado.
[3] São 4 seções, com 36 capítulos no total somados.
[4] Localizada na Bavária, possui atualmente em torno de 12 mil habitantes. Para mais detalhes ver https://pt.db-city.com/Alemanha--Bayern--Alt%C3%B6tting--Alt%C3%B6tting .

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