O
que um guia se propõe? Orientar seu usuário rumo ao caminho correto. Este
caminho pode ser simplesmente o destino geográfico de uma determinada viagem.
Mas também pode ser a formação de corações e mentes sobre um determinado tema.
A
série de Guias Politicamente Incorretos, que versa sobre diversos temas, tem
como mote central descontruir “guias” intelectuais introjectados pelos leitores
com o passar do(s) tempo(s). Ou seja, seria uma quebra de paradigmas.
Este
ato de “quebrar paradigmas” pressupõe que aqueles que o propõem possuem uma
visão distinta do status quo. Ou
seja, eles representam uma facção rebelde em relação ao pensamento vigente.
Esta ação leva, obviamente, a uma contrarreação dos pensadores – ou do grupo
que os representa – no sentido de não verem seu quinhão tão duramente
conquistado com o passar dos anos abalado por teses diversionistas.
Toda
essa balela acima, a meu ver, cai por terra se todos adotassem uma prática
muito simples: o leitor voraz, assíduo, aquele que o que lhe cai à mão já vai
dando uma olhada, desde bula de remédio até os diários de um ex-Presidente da
República, tem que ter em seu coração a seguinte máxima – o escritor é um ser
humano como outro qualquer, com ideias e desejos. Portanto, ele os expõe, mesmo
que subliminarmente, em quaisquer textos que venha a propor ao leitor. Cabe ao
leitor, portanto, ciente de tal fato, dar o devido desconto e ter um juízo
crítico sobre tudo que lhe chega.
A
obra a qual vamos analisar – Guia Politicamente Incorreto da América Latina –
Leandro Narloch e Duda Teixeira – Editora Leya – 2011 – 336 páginas – cai
justamente neste conjunto – desconstrutivistas, mas há que se observar, como
eles próprios indicam logo no início – ver citação abaixo - que têm uma visão
particular sobre o tema. A desconstrução feita pelos dois autores dos mitos
latino-americanos é sólida. Ambos jornalistas, ambos com passagem pela Revista
Veja*, ambos com trabalhos de pesquisa jornalística sobre o tema em questão
(Narloch como editor da revista Aventuras na História e Teixeira com um amplo
trabalho investigativo na região), ambos seres humanos.
O
que eu quero dizer com isto? Os que militam por suas teses, e que sempre
almejaram a desconstrução dos mitos por eles evocados – Che Guevara, Povos
Andinos da Antiguidade (Astecas, Incas, Maias), Simón Bolívar, a história do
Haiti e seus senhores negros, Perón e Evita, Pancho Villa e Salvador Allende –
se regozijarão com a qualidade e a quantidade do material levantado.
Bibliografia vasta e argumentos contundentes contrários à imagem cultivada em
torno de cada uma dessas figuras. O recado é claro e bem dado. Quem não for
partidário de tais teses, que pelo menos leia o livro para ter acesso aos
argumentos contrários para o qual irá se bater. Com a palavra os autores.
Depois lhes darei pequenas pílulas que eles apresentaram em sua obra:
Não nos sentimos
representados por guerrilheiros ou por indignados líderes andinos e suas roupas
coloridas. Não há aqui destaque para veias abertas do continente, mas para
feridas devidamente tratadas e curadas
com a ajuda de grandes potências. Conhecemos bem as tragédias que nossos
antepassados índios e negros sofreram, mas, honestamente, estamos cansados de
falar sobre elas. E acreditamos que todos os povos passaram por desgraças
semelhantes, inclusive aqueles que muitos de nós adoramos acusar. Por isso,
quando vítimas da história aparecerem nesta obra, é para revelarmos que elas
também mataram e escravizaram – e como elas se beneficiaram com ideias e
costumes vindos de fora. (...) Não importam as tragédias que Salvador Allende,
Che Guevara e Juan Perón tenham tornado possíveis. Importantes são o carisma, o
rosto fotogênico, a morte trágica, os discursos inflamados contra estrangeiros.
Por isso, não há como escapar: é ele, o falso herói latino-americano, o
principal alvo deste livro.
Páginas 19-20.
Pílulas
Che defendeu a
prisão de roqueiros e trabalhadores preguiçosos.
Ninguém matou
tantos por nada quanto os astecas.
Pancho Villa foi
um latifundiário cruel.
Allende
perseguiu a imprensa chilena e aliou-se a terroristas cubanos.
Narloch em debate em Recife, por ocasião da FLIPorto (2011) com o escritor e biógrafo, dito de esquerda, Fernando Morais. Fonte: Diário de Pernambuco** |
Milhares de
índios festejaram a vitória dos espanhóis sobre os incas.
Simon Bolívar
queira evitar que pobres e negros assumissem o governo.
Os
revolucionários negros do Haiti se tornaram reis. Escravistas.
Perón admirava
os nazistas – e meninas de 13 anos.
Para
fechar, gostaria de ressaltar um trecho colocado ainda no capítulo inicial
sobre Che Guevara. Trata-se do discurso do economista austríaco Ludwig von
Mises, numa de suas conferências no fim de 1958, em Buenos Aires, de como algo
que deveria ser seguido no tratamento das ideias, quaisquer que sejam elas,
contrário ao que foi aparentemente proposto pelo revolucionário argentino, e
que para mim é o maior e mais belo recado do livro:
Ludwig von Mises |
Liberdade
significa realmente liberdade de errar. Podemos ser extremamente críticos com
relação ao modo como nossos concidadãos gastam seu dinheiro e vivem sua vida.
Podemos considerar o que fazem absolutamente insensato e mau. Numa sociedade
livre, todos têm, no entanto, as mais diversas maneiras de manifestar suas
opiniões sobre como seus concidadãos deveriam mudar seu modo de vida: eles
podem escrever livros; escrever artigos; fazer conferências. Podem até fazer
pregações nas esquinas, se quiserem – e faz-se isso, em muitos países. Mas
ninguém deve tentar policiar os outros no intuito de impedi-los de fazer
determinadas coisas simplesmente porque não se quer que as pessoas tenham a
liberdade de fazê-las.
Pág. 72.
*
Nas palavras de Claudio de Moura Castro, colunista da supracitada revista, ao
comentar sobre os leitores que o abordam contrário às ideias que expõe: “Não
querem se conspurcar em uma revista de direita?” – Veja, 18 de Novembro de 2015
– edição 2452, ano 48 – nº 46 – pág. 18.
** Para mais detalhes sobre este debate ver http://www.old.diariodepernambuco.com.br/nota.asp?materia=20111114133503 . Uma pequena amostra: "Narloch chegou a ser vaiado pela plateia ao citar uma frase atribuída a Nelson Rodrigues ("socialistas com mais de 40 anos de idade não têm cérebro"). Morais também foi repreendido pelo público ao acender um charuto em ambiente fechado. Ao se defender, lembrou que a Fliporto é patrocinada pela Sousa Cruz. Os dois entraram em confronto de ideias o tempo inteiro. Enquanto Leandro afirmava qua o capitalismo é a melhor coisa para os pobres, Fernando mencionava as favelas que acabara de ver embaixo das pontes do Recife e questionava: "Pergunte aos moradores daquelas casas se o capitalismo é bom para eles."
Eu, definitivamente, não sou politicamente correta. Tenho que manter atenção constante sobre a audiência presente para não causar um tumulto por nada. Dou a todos a liberdade de falar a besteira que quiserem, mas a recíproca não é verdadeira. Ser livre e democrata é, definitivamente, muito difícil.
ResponderExcluirAcho que nunca afirmaram q a Democracia era fácil. Na verdade, acredito q todos nós temos um pequeno ditador dentro de nós, esperando q nossas vontades sejam respeitadas e atendidas.
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